11/15/2005

*







/A R R A N Q U E/ mostra de acções e textos


Este encontro surgiu de um intercâmbio que começámos a realizar com Francis O’Shaughnes no sentido de um grupo de artistas que trabalham a performance, do Canadá e de Lisboa, poderem viajar num e noutro sentido e trocar experiências, de organização de eventos como estes e também mostrar as investigações pessoais de cada um.
Este e outros encontros dos quais participámos, são uma excelente oportunidade para perceber a realidade exterior ao nosso contexto bem como as possibilidades e as dificuldades em agir perante diferentes contextos; Francis O’Shaughnes e Émilie Huot trabalham na parte Francesa do Canadá no Quebec, onde existem espaços abertos às novas práticas de representação e uma tradição dos centros artísticos se relacionarem directamente com a comunidade autorganizando-se política e esteticamente.
De maneira diferente assim dos ambientes culturais em Lisboa por exemplo, em que o modelo de construção cultural é o institucional, feito de estruturas pesadas e hierarquizadas, que o que proporcionam mais são experiências demasiado justificadas, mesmo que esta via faça perder a possibilidade do discurso autónomo, isento e pessoal.
Assim temos espaços pouco talhadas para a criação de espontaneidade, de participação, de construção em tempo real. Este espaço de encontro é também próprio para conviver, fazer umas jantaradas e beber um copo, congeminar.

O que nos interessa com estes eventos é a possibilidade do fazer plástico, respirar nas orelhas.
Este construir à mínima distância, transporta a fragilidade de actos íntimos, transposta em si a possibilidade destas respostas interiores poderem ganhar a luz do dia, poderem ser trocados em actos comuns que na sua intimidade trazem consigo algo de mais vivo...
Ao contrário da ocupação do tempo de lazer em construção de distância, como a TV, que ocupa o tempo, através da pacificação da experiência; o que pode estar bem, não pode é ser a única possibilidade, daí o nosso esforço na tentativa de criar espaços diferentes.










A expressão pode ser uma espécie de dádiva, porem a exposição pública é um problema para nós pelo tipo de comunicação que temos à nossa volta como dimensão pública (essas coisas de vender sabonetes).











Foi interessante no arranque ter-se proporcionando esse tempo de ver a acção do outro, empático, processos assumidos entre a acção, a apresentação, a instalação dos actos... o limpar dos despojos das acções, de como esses despojos criam objectos instalativos, ao contrário de algumas construções teatrais em que as representações se enclausuram, aqui os processos são abertos não tendem a estetizar apenas o ponto sublime, tudo ganha importância, e faz parte dos enigmas, desse suspense que antecede a experiência do outro.











Eu especialmente, fiquei contente do ambiente vivido ser simpático, visto que muitas vezes se vê os lugares da cultura como constrangedores e de desconfiança, parecendo que fazer cultura é o acto de criar distância por si, não a distância criada pela própria problemática dos trabalhos que implicam um pensamento complexo sobre uma realidade... mas sobre o acessório, dando origem a uma embalagem densa que inpermeabiliza a nossa aproximação.

contacto: accionoteca- cpnintape@yahoo.com
*
Comentário ás performances












A acção “Leitura de poemas experimentais” de Fernando Aguiar (Portugal):

A voz e as mãos destroem a coesão da linguagem, doce e inocente, como um embalo constroem um ritmo, frágil, os poemas uns a seguir aos outros com diferentes estratagemas de surpresa (ou é a voz que realmente não é projectada e é um leitor de cd que faz a sua vez, ou é a mão que bate na mesa que cria uma segunda imagem concreta das palavras, com estas a esvoaçarem) cada vez mais interactivo até ao final em que entre o vocal e os espectadores chovem letras de um lado para o outro, criando uma hilariante outra linguagem.
*










A acção de André Pimenta (Portugal):

A ideia que dá é a de uma ultima cena de um velho mundo, uma luz ténue focada formando um sitio, um circulo, o espaço do Ginjal tornado gruta onde um único foco ilumina uma cena de arquivista, este que vai identificando, numerando os destroços de um cubo de gelo gingante, que vai deixando cair no chão de pedra, o personagem leva uma camisola de lã grossa, toda cena remete para um fim ou um principio do mundo. Na acção repetidamente a presença forte do André construindo os movimentos ao seu tempo; de inicio é me difícil captar esse silêncio mas com tempo entra-se nesse ritmo suave, e concentrado, uma espécie de labor minucioso e atómico. A cena brilha com o gelo, esse apanhar de retalhos, é um bom exemplo de uma luta ontológica, principio da humanidade, o remate energético como acabou a acção foi cómico em vez de levar aquilo que era uma repetição processual ao obsessivo fim, pegou num bloco ainda grande do gelo, e deu-o ao rio, sem mais.
*









Acção de Geraldo Batista (México):

Entrou de rompante usando-se de uma espontaneidade que não podia ser premeditada, espécie de anti-estrutura do que iria acontecer, na mão trazia dois desintupidores, com eles ia aspirando tudo, desde os objectos que ali estavam, caixote do lixo, uma caixa de madeira, às próprias paredes do espaço, sugava e expelia, ao mesmo que tempo que por entre o publico serpenteava, um pouco selvagem ia se lá saber. Numa das paredes do espaço com as duas ventosas com tinta azul e vermelha deixou várias marcas... depois saiu a fugir, não houve tempo para palmas, eu percebi isto assim ele tirou o último sangue do espaço físico que aí estava, depois de querer sugar toda a matéria física que nos circundava, ou querer fazer isso, foi-se; não pareceu nada um acto premeditado, o que também teve interesse pelo ar de pergunta.
*








Acção de Kátia Mora (México):

Explora a construção de tempo entre o acto humano e a máquina, compasso da máquina, batedeira com água, espécie de analogia com uma máquina maior, que é esse espaço do Ginjal, maquina sobre o rio, usou peixes para pesca, estes elemento seriam os únicos visíveis quando se apagassem as luzes e não se visse nada da acção. Neste não momento de escuridão algo acontece, pregam-se tomates na parede e penduram-se peixes que luzem no escuro, por aí... a acção depois deste não momento (no escuro) em que se cria uma espera e se desperta a curiosidade sobre que tipo de acção exercida nos elementos que se tornaram numa instalação. A atitude da Katia parecia-me de encontrar soluções em tempo real que fossem criando sentido à estrutura pensada, para a criação da ideia.
*








A acção de Émilie Huot (Canadá):

A contenção profunda de uma dor ou revolta (cortou-se), entra como um batalhão, no crucifixo de uma condição feminina com os tachos e panelas a tilintarem em quanto marcha, o acto de sacrifício deixa-me calado é preciso ter coragem, entre o poder, e a mecanização a que obriga e a faz marchar, ela constrói uma situação de profundo mal estar.
*










A acção de Francis O’Shaughnes (Canadá):

Espécie de linguagem que se constrói narrativamente como anti-narrativa, a personagem da sua acção é uma mostra de –atitudes- que parecem caracterizar um ponto de revolta com o espetáculo como espaço público puro, usa o espaço de aparecimento público como um ponto de afirmação e revolta, punk, forma de auto-despreso pelo acto que comete, usa-se muito de um vai-te f... permanente, criando essa espécie de anti-narrativa, construção de ideias pessoalissimas, como ensaios, de uma estrutura de dizer. Algumas imagens ficaram-me como mais fortes, a repetição ao partir os pratos contra a parede, o que pintou na parede afirmando-se veado e não urso, a chamáda à procura de “chica”, ou o ridículo tango final enquanto limpa o cacos dos pratos.


*








A acção de Nuno Oliveira, “Leitura de corpo” (Portugal):

Leitura de um corpo comum, o sujeito apresenta-se sem olhos ou com os olhos sempre fechados, apresenta-se sem viver a sua imagem, imagem de uma intimidade como uma entrada para; segundo o próprio: revolta sobre a histeria da tendência ao nacionalismo, sobre o olhar sobre a emigração o medo da transnacionalidade de produtos económicos, esses receios à volta dos impérios e das suas marcas de identificação (pepsi, sake, caril, champagne), a experiência que é proposta é de tornar solúvel essas marcas, identidades, ultrapassando-as num processo que se pode ler desde o corpo... "Se não posso ler o meu corpo como posso ser democrata".
*








Acção do Grupo Mandrágora (Portugal):

Entraram os dois, os sujeitos da acção de fato de macaco vermelhos, talvez com a ideia de o trabalho no que toca ao criativo, poder sujar as mãos? A acção em si construiu-se através de pontos sarcásticos, primeiro dialogando com a pintura (com musica de fundo espanhola), rasga a tela e coze-a como um pescador; depois na segunda acção questionando-se sobre o registo sonoro, trabalham foneticamente de uma maneira melódica ou gritada enquanto interagem com o público e vão distendendo uma fita de cassete, parecendo evocar o paradoxo entre a construção sonora que progride pelo sistema de registos e mercado (o mundo discográfico por exemplo) e a nossa capacidade sempre possível de accionar no real o som. Criam duas acções que parecem muito estruturadas quase teatrais, mas que também têm interesse por isso, porque entram num género de simulação da narrativa, estando a pintar, estando a construir uma peça de som, destroem a própria simulação narrativa por dentro com referências auto-reflexivas sobre os elementos que usam, desenrolam essa fita enquanto a cantam, ou rasgam essa pintura enquanto a pintam.
*








A acção Bernardo Rodrigues, Pedro Veloso (Portugal):

Mudança de posturas, ironia face ao académico, uma espécie de ambiente de manifesto modernista, misturado com uma melancolia urbana coisa própria do poético do Bernardo, o cruzamento esquizofrénico das vozes, dos duplos, lutava de maneira interessante uma supravoz já muito indecisa do texto intimista com a teoria de arte sobre a criação de Vieira da Silva. Criaram uma dupla voz que conceptualizava o próprio acto de estar ali a desdobrar-se á nossa frente (falando eles da criação dos duplos quadros da Viera da Silva), enquanto praticavam um estralho desporto gemeo, para cima e para baixo, de lado em cima um em pé outro no chão, as folhas raspam o chão, qual codigo secreto entre essas duas criaturas, uma com um esquema de resposta sobre arte e a outra perguntando ao limite.
*








Video instalação e acção de Pedro Veloso (Portugal), Kaja Avbersek e Mateja Perosa (Eslovénia):

São Martinho das castanhas. Projecto de acção convívio, ao mesmo tempo que aconteciam as acções, estavam a assar castanhas para oferecer aos presentes enquanto um vídeo mostrava uma imagem industrial científica, quase antítese do acto simples e típico Português de assar castanhas como evento socializante, alguém com uma báta embala as castanhas em formas e verifica-as com o bisturi.
Parece problematizar sobre a questão da industrialização do quotidiano, o furo da utopia que a produção em massa de bens traria mais acesso à cultura e à liberdade para toda a gente, mostrando antes através da projecção vídeo como esse mesmo acto, de industrializar o assar castanhas, fáz lembrar uma perca acelerada.
O convívio como construção socializantes, na sua intrínseca troca de subjectividades, organiza-se de maneira multiple em amizades, em namoros, ou em lutas de bairro; o plano orgânico da vida de um bairro antigo de Lisboa, que ainda ai está mas já se recorda.

10/26/2005

*







A R R A N Q U E









Reflexão sobre dois momentos de acção, e as possibilidade de criar um espaço de dinâmica de participação e intervenção artística. Um mais a modo de mostra individual trabalhada segundo processos e propostas individuais e outro como desafio colectivo à intervenção, num contexto quotidiano.

No primeiro dia, dia 2 de Novembro, no espaço do Ginjal ás 20h, mostra de performances/ acções, espaço de alguma visibilidade para estas propostas, que acolhe um tempo de observação e contemplação do outro à partida mais total...onde se pode apelar ao movimento (movimentos operados interiormente, as mudanças ou deslocações do pensamento da percepção, tanto de quem faz como de quem observa), destabilizar uma relação de passividade para com a experiência alheia...
No segundo dia, dia 3 de Novembro ao meio dia (encontro marcado no espaço do Ginjal) propõe-se um desafio, uma proposta discutida entre todos os interessados, para ser trabalhada em conjunto num restaurante chinês. Trocamos ideias enquanto almoçamos, para uma intervenção instantânea ali, ou não!
...A proposta de explorar o sítio e a situação já como aprendizagem e acção criativa, a observação/sugestão do ambiente, materializada com reflexões trocadas entre nós, pode possibilitar a tempo real um conhecimento instantâneo, das ideias anteriores reflectidas nos actos, assim poderão acontecer acções ligadas umas ás outras, que conformam um processo de descoberta. E talvez neste processo a percepção seja menos totalitária e controlado por cada um, mas mais fragmentada, operando a um nível mais subtil ou invisível, confuso e susceptível ao exterior...
*









A R R A N Q U E dia 2 ás 20h e 3 ás 12h, de Nov.





encontro de performance e intervenção artística
Rua Cais do Ginjal, nº53, 2800 Cacilhas, Almada.

Participantes:
Bernardo Rodrigues, Pedro Veloso, Fernando Aguiar, Nuno Oliveira, Grupo Mandrágora, André Pimenta, Margarida Chambel (Portugal); Kátia Mora (México); Francis O’Shaughness, Émilie Huot (Canadá); Kaja Avbersek e Mateja Perosa (Eslovénia).
*








apresentação

.....................................................................................................Reflectir sobre a participação, a autoria, a interacção ou relação, as possibilidades de acção artística como experiência desalianante, directa.

e convite à participação neste espaço de trabalho Accionoteca.
-projecto em construção... estamos preocupados em procurar e propor um espaço de vitalidade, de experiências directas, nos acontecimentos e eventos que pensamos. Não pelo cultivo do anonimato ou do trabalho colectivo (só ás vezes), mas por questionar activamente uma autoria centralizada, inflacionada, controladora e auto-reguladora também. Uma procura de lugares de expressão, híbridos. Ainda não identificado. E com o problema de “La muza tiene mi teléfono pero yo no tengo el suyo”Filliou....
Guida Chambel

activar, agarrar, lembrar, tocar e ter, posicionamentos face à cultura, tomar a cultura para que esta se faça em acção, acção sobre as ideias que se contemplam ou se criam... interessa-nos.
.a abertura que as práticas artísticas contemporâneas proporcionam, onde se hibridizam formas de representação: gráfica, de registo mecânico, modular, sonoro, instalativo, trabalho de corpo ou mesmo o uso alérgico da representação na performance (a performance foge das formas pré-organizadas da representação mas usa-se delas)... interessa-nos.
.também que este espaço de trabalho não se torne hermético, e que possa agir sobre esta realidade; que cruamente etc..................................etc e etc e etc e sobre etc poderemos trocar ideias..............aceitamos propostas de trabalho sobre etc em cpnintape@yahoo.com.
Nuno Oliveira